Engarrafamento na Avenida Brasil,no Rio — Foto: Fabiano Rocha / Agência O Globo
GERADO EM: 08/02/2025 - 21:59
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Há poucos dias foi divulgada uma pesquisa que aponta o Rio de Janeiro,entre seus pares nacionais,como região metropolitana de maior tempo de deslocamento entre casa e trabalho. Infelizmente,o que o relatório afirma está longe de ser novidade,pois os estorvos enfrentados diariamente pela população do Grande Rio revelam um problema estrutural e histórico.
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Em artigo que publiquei há dois anos no GLOBO,intitulado “Imobilidade urbana do Rio tem razões antigas”,destaquei que a precariedade da mobilidade no estado não é recente,mas resulta de décadas de investimentos inconsistentes,promessas políticas vazias e de um modelo urbano que perpetua a segregação social. A falta de transporte eficiente aprofunda desigualdades,pois quem mora nas periferias é obrigado a perder horas em deslocamentos diários,comprometendo qualidade de vida e capacidade de ascensão social.
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O cruzamento entre a crise da mobilidade urbana e a baixa mobilidade social é evidente. A dificuldade de acesso a empregos e educação de qualidade afeta desproporcionalmente a população de menor renda,que se vê presa a um ciclo de pobreza. No Rio,a questão se agrava ainda mais pela presença de pelo menos quatro grandes facções criminosas em constante conflito. A guerra territorial imposta por esses grupos não apenas torna perigosas algumas rotas,mas também fragmenta o tecido urbano,dificultando ainda mais os deslocamentos e limitando o desenvolvimento de regiões inteiras.
Promessas frustradas são um traço marcante da gestão pública no Rio. A candidatura Rio-Niterói para sediar o Pan de 2031 veio acompanhada de novas promessas,como a construção da Linha 3 do metrô e a despoluição da Baía de Guanabara. A população já viu esse filme. Basta lembrar que,há quase 20 anos,o Rio se preparava para os Jogos Pan-Americanos de 2007 e pouco depois para os Jogos Olímpicos. Mas as prometidas expansão considerável da malha metroviária e despoluição da Baía (que facilitaria também a expansão do transporte aquaviário) jamais se concretizaram.
Para piorar,mesmo que houvesse um projeto de mobilidade urbana realmente sério,a situação fiscal do estado compromete qualquer possibilidade de investimento significativo. O Rio de Janeiro está em recuperação fiscal. Isso significa que o governador tem pouca margem para alocar recursos em obras estruturais de grande porte. Tal cenário põe o estado em posição de dependência do governo federal ou de parcerias privadas para tirar projetos do papel.
Diante desse panorama,a pergunta que fica é: até quando a cidade continuará aprisionada em sua própria paralisia? Como dizia o escritor carioca e imortal da ABL Carlos Heitor Cony:
— O Rio é essa cidade em que tudo parece possível,e nada se realiza.
Enquanto o poder público não enfrentar com seriedade os desafios da mobilidade urbana,apenas pequena parcela da população continuará a desfrutar a cidade sem os obstáculos diários de um transporte público ineficiente e desigual.
*Marlon Cecilio de Souza,economista,é especialista em política e sociedade pelo Iesp-Uerj e analista de risco de crédito no Bank of New York